Recuperação Judicial como processo de negociação

A crise que vem assolando o país desde meados de 2014, talvez seu ponto mais alto, fez com que o número de pedidos de recuperação judicial aumentasse consideravelmente. Nesse sentido, talvez tenhamos esse procedimento como um dos grandes propulsores de um novo fôlego que toma a economia, o que coaduna com o sentido real da Lei, editada em 2005.

Contudo, para que esse real intuito seja alcançado, é necessário que sejam analisadas algumas das razões que levam ao sucesso ou ao fracasso do instituto. A principal delas, ao que se vê, é o viés negocial que se dá principalmente durante o chamado stay period, que nada mais é do que o tempo em que ficam suspensas as ações e execuções individuais em face da recuperanda.

Em primeiro lugar, devemos lembrar que é sim o objetivo da Lei que as partes negociem a melhor solução para a empresa em dificuldade. Caso contrário não se atenderiam os verdadeiros interesses dos credores e o processo seria resumido à definição que se dava à antiga concordata, que era de “antecipação da falência”, muito diferente do que prevê o art. 47 da Lei n. 11.101/05:

Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Assim, é fundamental que tanto o devedor quanto os credores, protagonistas de um reformulado processo judicial de recuperação de empresas dificuldade, se entendam e, principalmente, discutam alternativas que levem tanto à satisfação financeira geral quanto, mais importante, à manutenção de uma atividade produtiva e geradora de renda e empregos, desde que ela se demonstre viável.

Tal é a vontade de que as partes estejam em constante comunicação e tanta é a relevância dada aos credores, que até o próprio Juiz e mesmo o Ministério Público atuam muito mais como fiscais do cumprimento da Lei e, no caso do primeiro, com a atribuição de evitar excessos de qualquer das partes. Um exemplo claro disso é que, caso aprovado o plano em Assembleia pelo Quadro Geral de Credores, o Juiz deve, a não ser em casos excepcionalíssimos em que se verificar ilegalidade, homologa-lo.

Daí se vê que uma boa negociação pode ser decisiva para o alcance dos fins da Recuperação Judicial. Os credores, exercendo papel de protagonista, acabam por exigir, com razão, que o devedor não se utilize de manobras escusas para tentar sair do vermelho. Caso assim o faça, poderá sofrer efeitos nefastos.

E até mesmo o juridiquês, de vez em quando, é deixado de lado para dar mais amplitude à conversa sobre juros, deságio, índices de inadimplência e outros conceitos econômicos que são tão quanto ou mais importantes do que as definições da lei. Para os que atuam na área, portanto, apenas o conhecimento do direito não é o bastante, mas sim só o começo.

Fonte: Luca Rizzatti Mendes – Advogado Carnelos Advocacia